3 de junho de 2025 – 18h00
Sabe aquela história de que Estados Unidos e China disputam a guerra comercial e narrativa sobre inteligência artificial? Pois é. O SXSW Londres 2025 surpreendeu ao colocar importantes expoentes europeus – britânicos, para ser precisa – nos palcos principais do primeiro dia do festival, no último dia 2.
O debate aqui é mais profundo. Não trata apenas de corrida comercial, mas de aspectos fundamentais como governança, democratização e balizas éticas regulatórias.
Três especialistas e investidores em tecnologia, Demis Hassabis, Azeem Azhar e Thomas Wolf, compartilharam visões complementares sobre o futuro da inteligência artificial e seus impactos na sociedade.
Demis Hassabis, cofundador e CEO da DeepMind, conquistou o Prêmio Nobel de Química juntamente com John Jumper, por seu trabalho no desenvolvimento do AlphaFold defendeu o uso da IA como ampliação da inteligência humana, e não como uma substituta. Segundo ele, “o verdadeiro potencial da IA está em expandir nossas capacidades científicas e médicas”. Para isso, ressalta, o uso ético e responsável da IA exige coordenação global, não só entre empresas, mas também entre governos e comunidades científicas.
Ao comentar sobre os riscos futuros, alertou que “se não desenvolvermos IA com responsabilidade, poderemos construir sistemas que não compreendemos completamente – e isso deve ser uma preocupação compartilhada globalmente.”
O pesquisador Azeem Azhar classificou a atual transformação como uma “revolução silenciosa”, cada vez mais pervasiva, mas nem sempre visível. Até 2030, apostaele, estaremos sentindo os efeitos acumulados de anos de crescimento exponencial em desempenho, computação, difusão e investimentos. “Nossa mente funciona de forma linear, mas a IA evolui em curvas exponenciais”, destacou, enfatizando nossa dificuldade em entender a velocidade e profundidade dessas mudanças.
Também abordou impactos econômicos e sociais, como o crescimento modesto do PIB, transformações no mercado de trabalho e a mudança no valor das habilidades profissionais. “Estamos passando do ‘saber como’ para o ‘saber por quê’”.
Thomas Wolf, cofundador da Hugging Face, chamou atenção para o risco de concentração de poder tecnológico: “Existe um futuro em que toda essa tecnologia é construída por apenas duas empresas – e nosso principal trabalho é garantir que esse futuro não aconteça”. Defendeu um modelo aberto e colaborativo, comparando o futuro desejável da IA à construção coletiva da Wikipedia. Para ele, os custos de desenvolvimento já são mais acessíveis, o que pode viabilizar uma IA mais democrática.
Os três palestrantes discutiram o impacto ambiental da IA. Azhar mencionou os altos custos energéticos, mas apontou avanços em eficiência e a possibilidade de a pressão energética acelerar inovações em energia limpa. Wolf propôs a execução local de modelos para reduzir o consumo e ampliar o acesso. Hassabis reforçou: “Não podemos permitir que o progresso em IA venha à custa do planeta”.
Wolf encerrou com uma visão pedagógica e acessível: “A IA será tão fundamental quanto a física quântica. Todos deveriam poder aprender sobre ela”. Já Hassabis, em tom mais reflexivo, observou que “a IA não é apenas um desafio técnico, é um teste de maturidade ética e civilizatória”.
Neste SXSW, Azhar, Wolf e Hassabis ofereceram um contraponto valioso à ideia de que o debate global sobre IA está restrito a Estados Unidos e China. Do alerta ao otimismo cauteloso, o trio mostrou que a Europa tem muito a contribuir com uma inteligência artificial mais aberta, confiável e humana.